Razão pela qual existe a crítica histórica
Conforme foi dito no início, é a própria condição dos testemunhos que valida a existência da crítica histórica. E não é possível confirmar a eficácia da crítica sem que se veja o seu efeito surtido.
A autenticidade do documento
Por sua vez, o recurso a este método executa-se de duas feições: externamente, dedicada à análise da autenticidade do objecto, e internamente, orientada para a credibilidade do documento. Ou seja, o documento é analisado enquanto objecto e enquanto mensagem. Assim, este método permite desencobrir o falso relato e compreender o motivo da sua existência: “Aí temos, portanto, a crítica conduzida a procurar, atrás da impostura, o impostor; quer dizer conforme à própria divisa da história, o homem” (p.q132).
Bloch adverte-nos para os tipos de fraude mais comum com que o historiador se debate, nomeadamente quanto ao autor, à data e conteúdo do documento. Dá vários exemplos sobre o caso, de entre os quais se salienta aquele referente a Denis Vrain-Lucas, um falsário francês do século XIX.
Contudo, há outra forma de falsificação de documento que o autor descreve como “insidiosa” (p.134): a interpolação. Isto é, a forma que a mentira tem de se aproximar mais da realidade, onde se reveste de um fundo de verdade e discretamente se dissimula.
A psicologia do testemunho
Bloch faz menção à Psicologia do Testemunho e deixa-nos algumas considerações, nomeadamente que a memória, nosso “aparelho de registo”, é susceptível ao engano, a erros de percepção, à confusão de informações, à contaminação do raciocínio pelas emoções e, por conseguinte, não é totalmente fidedigna enquanto fonte de informação. Assim, aqueles testemunhos de antecedente mais imediato a um acontecimento histórico, não deverão ser tomados à letra da sua descrição, mas antes como um contributo isolado para a reconstituição do evento.
No seguimento deste raciocínio o autor diz que um relato deturpado pela percepção humana tem “valor documental” (p.139), pois é igualmente genuíno e demonstrativo. É nele que se lêem as entrelinhas, ou melhor, as mentalidades subjacentes à época. A cultura, a tradição, a superstição, os preconceitos e as concepções então existentes são tão relevantes quanto os esforços para as isentar da narrativa.
A crítica histórica não pode ser de interpretação unilateral
Por todos os motivos característicos da fraqueza moral das fontes e testemunhos, o autor explica que o método da crítica histórica não pode ser de interpretação unilateral, tendo obrigatoriamente de estabelecer comparações, e mesmo assim, não é seguro considerar um número determinado de conclusões sobre um objecto de estudo como verdadeiras, mas antes como a bússola de um conjunto de probabilidades aproximadas à realidade de um evento numa época passada.
O passado não se pode alterar nem verificar, mas o conhecimento sobre ele pode apurar-se através da crítica.
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Marc Bloch e o método de observação histórica
Bibliografia
Bloch, M., Bloch, É., Le Goff, J. (1997). A observação histórica. In M. Castro (Ed.), Introdução à História (pp.103-121). Mem Martins: Publicações Europa-América, Lda.