Neste artigo conheça as crenças e rituais romanos e uma marca de originalidade da civilização romana: a criação de divindades domésticas.
Além do célebre panteão divino, a religião romana tinha por base outras manifestações de índole religiosa. Estas resultaram da mentalidade dos povos primitivos, da ligação dos romanos à terra, da sua concepção de morte e das suas arreigadas crenças e superstições. A este conjunto acrescenta-se ainda uma marca de originalidade da civilização romana: a criação de divindades domésticas.
Fique a conhecer algumas das crenças e rituais romanos como:
- os Numina
- os rituais agrários
- as divindades domésticas
- os espíritos dos defuntos
- os presságios
Crenças e rituais romanos – os Numina
Uma das heranças espirituais legadas aos romanos pelos pequenos povoados que se fixaram no local originário da cidade de Roma foram os Numina. Estes consistiam em forças sobrenaturais, entidades e espíritos, presentes no quotidiano dos romanos e nos locais que os rodeavam. Por exemplo, o acompanhamento do recém-nascido era feito por diversos numina, nomeadamente: Nona e Decima, que presidem aos últimos meses de gravidez; Numeria, designado para acompanhar a mulher romana durante as dificuldades do parto; Porrina e Postvorta, numinas relativos às duas posições do naciturno; Lucina, relativo ao nascimento; Alemona, encarregue de levar o leite ao seio materno; Potina, que ajudava a criança a beber.
Outra manifestação destas entidades, os numina, encontra-se na veneração de certos lugares que consideravam marcados por um determinado poder, tais como fontes, grutas, bosques e montes também. A Fonte de Carmenta, situada na base do Capitólio, e as fontes sagradas das Camenas, (Egéria e Ferentina), são disso exemplo. A veneração da escarpa frondosa do Fatugal, considerada como o bosque de Juno, Lucina, bem como a adoração da figueira Ruminal, onde se presume ter aportado o cesto em que Rómulo e Remo tinham sido depositados, são também casos demonstrativos.
Cultura, crenças e quotidiano na Roma Antiga
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Crenças e rituais romanos – os rituais agrários
A existência de rituais agrários e de fecundidade são símbolo da íntima ligação dos romanos com a terra. Numa Pompílio (715-673 a.C.), segundo rei de Roma, criou um calendário de festividades associadas a diferentes actividades agrícolas.
O deus principal destas actividades foi Marte e de quem o primeiro mês do ano romano recebeu o nome, Martius (Março), altura em que se iniciava um novo ciclo de vida e de produtividade agrícola.
Estes dias festivos, ou feriae publicae, eram o reflexo dos ciclos das estações e das actividades agrícolas mais importantes. Destacam-se os Palilia (21 de Abril), destinados a propiciar a fecundidade dos rebanhos, os Consualia (Agosto e Dezembro), em que se consagravam os cereais que iriam servir de semente e se celebravam as ceifas e as colheitas com sacrifícios e corridas de animais que tinham participado nas actividades agrícolas.
Estes rituais poderão ter estado na base dos espectáculos do Circo Máximo, tendo em conta que foi erguido no local onde tradicionalmente se celebravam.
Crenças e rituais romanos – as divindades domésticas
As divindades domésticas são uma inovação religiosa do povo romano.
Os cultos a elas prestados eram de natureza privada e realizados num lugar específico do lar, no cruzamento de propriedades (compitum), ou em encruzilhadas, na figura dos Lares compitales.
Em cada casa existia uma divindade protectora do lar e dos membros da família, incluindo libertos e escravos, genericamente denominada de Lar familiaris. A imagem que o representava era geralmente colocada junto da lareira, num nicho intitulado lararium.
Eram-lhe dedicados três dias em cada mês: kalendae, nonae, idus, e era com esta entidade que se relacionavam todos os acontecimentos do seio familiar.
Os Penates eram as entidades que velavam pelo local de aprovisionamento de alimentos, sendo a origem da palavra penus, “despensa”, e o seu culto era prestado diariamente pelo Pater Familias, lançando alimentos sobre o fogo, quando um momento de silêncio interrompia a refeição, ou deixando oferendas alimentares à sua disposição.
O Genius é outra das divindades do lar romano e a palavra busca o seu significado em “geno”, que significa gerar ou nascer, a ele estando consagrado o leito nupcial, ou lectus genialis.
Crenças e rituais romanos – os espíritos dos defuntos
Quanto à concepção de morte dos romanos, é de notar que tinham temor aos espíritos dos defuntos e que ficar insepulto era uma das maiores condenações que alguém podia sofrer, por isso, havia um membro da família designado ao zelo da sepultura, o filho mais velho.
Era um acto de pietas atribuir sepultura e um acto de impietas não o fazer, correndo-se o risco de o espírito do defunto assombrar e prejudicar os vivos.
Além de ser um acto de punição para a alma de quem morria, era também um impedimento à celebração e cumprimento dos rituais romanos religiosos estabelecidos no calendário, como os dies parentales, ou Parentalia, cuja função era assegurar todas as necessidades específicas dos mortos, de que é exemplo o banquete sagrado, ou daps, refeição em que mortos e vivos participavam em conjunto. Manes, ou “os Bons”, era a designação que os romanos atribuíam aos espíritos dos mortos, pese embora Ovídio os tenha documentado como Lemures, ou Laruae (fantasmas). A eles eram dedicados os dias 9, 11 e 13 do mês de Maio.
Crenças e rituais romanos – os presságios
As crenças no poder dos presságios e a natureza supersticiosa dos romanos estão sobretudo presentes na interpretação de prodígios e nas práticas da adivinhação.
Os presságios diziam respeito a acções futuras, anunciando o que poderia acontecer de mau caso não se tomassem as devidas providências, assumindo duas formas: a de omina, ou prenúncio, expressa através de palavras que ganhavam ocasionalmente duplo significado, e a de auspicia, dedicado à observação do comportamento das aves.
Os prodígios eram fenómenos terríveis ou tidos como estranhos à natureza, tanto aqueles relativos aos astros e ao espaço, nomeadamente eclipses e cometas, ou de outra origem, como os nascimentos anómalos, entre outros.
Estes eram considerados como expressão da ira divina, marcando a quebra da pax deum, constituindo uma ameaça a um indíviduo, grupo ou mesmo cidade. Mas o espírito pragmático dos romanos também se manifestava neste domínio, pois através da consulta dos pontífices (chefes religiosos), dos livros sibilinos ou dos arúspices, podiam atenuar os seus efeitos maléficos.
CENTENO, Rui Manuel Sobral (coord.) – Civilizações Clássicas II. Roma. Documento pdf. Manual de História das Civilizações Clássicas. 1º ciclo de Estudos em História. Acessível na Plataforma de E-Learning da Universidade Aberta. Artigo publicado no Jornal da comunidade cientifica de língua portuguesa – A Pátria.
Diana Carvalho
Mestre em História e Património, membro do Conselho Científico da Revista Herança e colunista em a Pátria. Está actualmente integrada como técnica nas escavações arqueológicas do Castelo de Leiria. É também autora de artigos científicos na vertente do Património Cultural e da História.