Joana d’Arc (c. 1412 – 1431). Esta camponesa, heroína na Guerra dos 100 Anos e santa francesa tem inspirado ao longo da história todo o tipo de artistas.
Da pintura e escultura à literatura, música e teatro, passando pelo cinema, ilustração, animes e videojogos, encontramos representações desta jovem que morreu com apenas 19 anos nas fogueiras da inquisição.
Quem foi esta heroína e como decorreu o seu julgamento e processo inquisitorial são alguns dos aspetos que iremos ver neste artigo.
Textos: Fátima Muralha | Julgamento de Joana d'Arc: Rocio Rivas Martinez, autora do curso online Historia de la Mujer.
Litografia de 1918, Biblioteca do Congresso, E.U.A Joana d'Arc salvou a França. Mulheres da América, salvem o vosso país comprando títulos de guerra. Fonte: https://pt.frwiki.wiki/wiki/%C5%92uvres_inspir%C3%A9es_par_Jeanne_d%27Arc
Joana d’Arc – a heroína
A guerra dos cem anos opôs a França e a Inglaterra nos séculos XIV e XV. Fundamentada na pretensão da Inglaterra ao trono francês e atravessada por vários conflitos entre casas reais e pretendentes ao trono.
Entre 1407 e 1435 uma crise dinástica gerou ainda uma guerra civil que opôs os Armagnacs (Casa de Orléans) aos Borguinhões (Casa de Borgonha).
O ainda não coroado Carlos VII liderava a oposição ao domínio inglês.
E foi por esta altura que a jovem Joana d’Arc, liderando um exército de camponeses, teve um papel preponderante na Batalha de Orléans. Em nove dias de batalha os ingleses foram derrotados e Orléans libertada do cerco que decorreu entre 12 de Outubro de 1428 – 8 de Maio de 1429. Carlos VII foi coroado em 1429.
Os feitos militares de Joana galvanizaram os sentimentos nacionais dos franceses e a jovem foi elevada à condição de heroína.
Joana d’Arc – a mártir
A 23 de maio de 1430 foi capturada pelos borguinhões, a 9 de janeiro de 1431 teve inicio o seu julgamento sob acusações de bruxaria liderado pelo bispo bispo Pierre Cauchon.
Joana alegava receber visões divinas do arcanjo Miguel, de Santa Margarida e da Santa Catarina, e que teriam sido estes a dar dar-lhe instruções para apoiar Carlos VII.
Vale a pena olhar para o julgamento de Joana d’Arc que nos revela algumas superstições do século XV e onde se entrelaça o real e o imaginário. É o que faremos de seguida.
Historia de la Mujer (género)
Curso online (em espanhol)
O julgamento de Joana d’Arc
O processo inquisitorial de Joana d’Arc (século XV).
Pois bem, neste processo, segundo alguns autores como Mª Luisa Bueno Domínguez, temos todo um compêndio de superstições que perdurou no século XV e onde o real e a magia se entrelaçam se aproximam e se revelam:
• A presença da floresta como um lugar mágico no qual os santos aparecem a Joana, especificamente a floresta Chenu em Domremy. Onde, segundo a crença popular, existia uma árvore pertencente às fadas e uma fonte com propriedades curativas.
• O anel [1] (do qual foi despojada e no qual tinha os nomes de Maria e Jesus gravados) e a espada (encontrada atrás do altar da Igreja de Santa Catalina de Fierbois), aos quais são atribuídas propriedades mágicas e curativas.
Vejamos, então, um fragmento do interrogatório a Joana d’Arc, no qual se observa claramente estas ideias: (Bueno Domínguez, 2003)
•Como sabes - perguntou o juiz com ousadia - que o ser que apareceu é um homem ou uma mulher? • Em primeiro lugar, pela voz e depois porque mo revelaram. Não sei nada que não seja por revelação e ordem de Deus. • Como eram as figuras que viste? Tinham cabelos longos e ondulados? • Eu não sei nada sobre isso ... • Como falavam, visto que não tinham corpo? • Deus sabe disso e eu remeto-me a Ele. • As santas usavam muitos brincos nas orelhas? Usavam anéis? • Tinham dois dos quais não haviam sido despojadas. • Os santos que te apareceram não eram as fadas das quais se falava em Domremy, aquelas que a tua própria madrinha afirmava ter visto? Conversaste com as santas debaixo da árvore onde se diz que se reuniam as fadas? Junto da fonte perto da árvore?
Como se pode ver, no julgamento de Joana d’Arc há elementos relacionados com as crenças popular-pagãs e que, por sua vez, foram fundamentais para que ela fosse acusada de feitiçaria.
Porém, o que também vemos em Joana d’Arc é uma mulher que quebra o esquema estabelecido e um caráter incómodo: ela adota as funções que o homem pressupõe (força e o papel militar / guerreiro).
Além disso, sabemos que sua figura foi fundamental na última etapa da Guerra dos Cem Anos (conflito entre a França e Henrique VI pelo trono de França) e na coroação de Carlos VII.
A REALIDADE:
• Mulher que quebra o esquema estabelecido.
• Caráter desconfortável: adota as funções que são atribuídas ao homem: força e papel militar / guerreiro = mudança de papel.
• Ela cumpre a tarefa que lhe foi indicada por várias vozes divinas (Santa Catarina, Santa Margarida e São Miguel) e Deus: liderar um exército para expulsar os ingleses de França.
• A sua figura foi fundamental na última etapa da Guerra dos Cem Anos: depois de ser rejeitada em várias ocasiões e ser examinada por teólogos, Carlos concedeu-lhe o comando de um exército com o qual conseguiu derrotar os ingleses em várias campanhas.
• Finalmente, Carlos foi coroado Carlos VII, e Joana, após várias derrotas, condenada por feitiçaria e queimada na fogueira na Praça de Rouen em 30 de maio de 1431.
[1] Acreditava-se que as fadas davam anéis aos seus protegidos. [2] Depois de ser rejeitado várias vezes e examinado por teólogos, o Príncipe Carlos concedeu-lhe o comando de um exército.
Joana d’Arc – a santa
Em 1456, o seu julgamento foi revisto por um tribunal inquisitorial. A sua inocência foi proclamada e Joana foi formalmente nomeada mártir da igreja.
Em 1803, Joana d’Arc foi oficialmente declarada como um símbolo nacional de França por decisão do imperador Napoleão Bonaparte. Foi beatificada em 1909 e canonizada em 1920 pelo Vaticano.